O Gigante Adormecido

Milhares de pessoas no centro do Rio. Fonte: aviacaocivilemilitar.wordpress.com

Milhares de pessoas no centro do Rio.
Fonte: aviacaocivilemilitar.wordpress.com

Boa noite!

Quanto tempo! Vida corrida e cheia de imprevistos!

Postarei agora um texto escrito no auge das manifestações brasileiras, em junho de 2013. Estava de licença médica, acamada na casa de um parente onde não há internet, portanto, não consegui me manifestar. Queria publicar fora do tempo mesmo assim, mas tive muito trabalho acumulado devido ao repouso e ao cuidar do lançamento de dois livros, de uma série de filmes sobre o escritor e, a maior parte do tempo, atendendo, também, as necessidades de outras pessoas.

Como as manifestações ainda são tema de debate, quero deixar registrada minha opinião. Este texto foi escrito em 19/06/2013 e representa o que eu pensava desde o começo, antes de ter ouvido, posteriormente – somente com o desenrolar de novos fatos -, posicionamentos similares:

O gigante adormecido

Fonte: rfnoticias.com

Fonte: rfnoticias.com

Hattag “O gigante acordou”. Por que, afinal, esteve todo este tempo dormindo? Acordou, por qual razão? Porque foi às ruas e expressou o que sentia? E depois? Ficará eternamente nas ruas para fazer valer sua vontade e viveremos em desordem, ou as cidades voltarão a respirar e aqueles indivíduos continuarão isolados, em suas rotinas, e tudo continuará igual?

A meu ver, democracia é como reunião em condomínio: preferiu pensar no “eu” e sucumbiu ao descanso ou ao momento de lazer, enquanto outros, igualmente cansados ou entediados, esforçaram-se para uma reunião monótona, mas em prol de si mesmos e da coletividade, e agora quer reclamar das decisões realizadas?

A vida tem uma regra que nem todos, mal acostumados psicologicamente falando, ainda absorveram: o efêmero dá prazer, é fácil de obter, mas não dura, e o que é sólido precisa ser construído, por um pouco mais de tempo. Assim, é fácil querer receber, mas difícil existir quem se comprometa a doar, porque dá trabalho. A consequência desta falta de sabedoria de vida é a mania de querer reivindicar direitos e mais direitos, sem antes ter cumprido o seu dever.

Politicamente falando, como cidadã, contrapondo duas figuras alegóricas – o Povo e o Estado – minha alma democrática está orgulhosa, assim como a opinião pública, e se emociona quando vê milhares de pessoas marchando pacificamente em prol de uma causa nobre. A energia coletiva capaz de existir entre os seres humanos é muito forte, poderosa e bela, e já me emociona em causas menos sérias, como um hino de futebol ou samba enredo de carnaval. Ufa! Finalmente o povo demonstrou superioridade ao pão e circo moderno, unindo-se não apenas pelo prazer, mas também por algo trabalhoso, que reflete diariamente em seu dia a dia.

Ainda democraticamente falando, como cidadã, não posso deixar de apontar algo que também é senso comum e lamentável: o vandalismo e a violência, presentes constantemente em todo este movimento. Aí, a cidadã sai e fica a essência, maior que posições políticas, profissões, raças, credos, nacionalidades: o ser humano.

As pessoas são diferentes. Existem várias opiniões e condutas. Dentre elas, os baderneiros que sozinhos não agiriam, mas tanto por estarem reunidos com outros afins e ganharem força, quanto por serem protegidos pela multidão exercendo a cidadania que, em nome da manutenção da democracia, não pode ser atacada pela força policial, aproveitaram para extravasar seu depreciável comportamento. Usa-se uma coisa bela – o exercício da liberdade de expressão política – para justificar algo horrível: a violência, a depredação, o fogo, a revolta, o saque, a destruição. A manifestação legítima torna-se, pelo (baixo) nível cultural de nossos cidadãos, uma brecha legalizada para a prática da subversão.

Fonte: margaritasemcensura.com

Fonte: margaritasemcensura.com

Como ser humano, eu me preocupo com os cidadãos que, por motivos variados, não podem faltar ao seu trabalho para se expressar, contudo, sofrem todos os prejuízos demonstrados pela causa pela qual lutam e que, além disso, são molestados também em seu direito de ir e vir. Preocupo-me com caminhões de carga que não circulam, deixando de entregar não apenas necessidades comuns, mas remédios, que certamente custam ou ao menos complicam vidas; penso nos doentes e familiares, além de funcionários que deveriam ter boas condições de trabalho (silêncio, segurança) para zelar pelos internos de um hospital, os quais têm também lutas nobres a serem alcançadas, com o agravante da limitação instintiva da dor ou do abalo psicológico; penso no trabalhador que chegou pela manhã e teve seu estabelecimento saqueado – e não foi só um; penso em cada um de nós que terá que pagar, de novo, pelo patrimônio público depredado.

Na Administração existe um conceito chamado “custo/benefício”. Ao fazer a compra ou a venda de um produto ou uma mudança na diretriz de gestão, não apenas o lado financeiro é analisado, pois o que teria a possibilidade de representar falta de lucro imediata no Livro Caixa, poderia trazer dinheiro a médio ou longo prazo, graças à publicidade ou ser revertida em estímulo aos funcionários, que produziriam mais, por exemplo. É preciso, portanto, enxergar além do óbvio.

Por mais legítimas e emocionantes que sejam, com saldo positivo na balança democrática, pergunto-me, como ser humano, se estas manifestações inicialmente pacíficas, mas sempre transformadas em perturbadoras, estão sendo realmente efetivas para o bem estar coletivo, para a paz. Temo que este movimento se descontrole e haja consequências mais graves.

Penso no medo de quem está preso nos carros – que já foram queimados -, em ônibus – que já foram tomados – no comércio – cuja população nele refugiada já foi até ameaçada – e, por que não lembrar, nos policiais que, em número bem menor, ficaram sitiados.

Sei que ao analisar os fatos como um todo, a Polícia é uma alegoria. Mas os policiais são seres humanos como nós e cidadãos mal remunerados, vítimas de tudo o que reclamamos. Suas mães, esposas e filhos entram em desespero ao acompanhar pela televisão a situação deles e cogitar se são um dos seus já feridos; ou se sairão com vida, se a manifestação pacífica, que de um minuto para o outro – e esta é a dificuldade ao lidar com multidões e com manifestações corpo a corpo – pode virar um confronto. Porque a questão do medo é que, para o jornal tirar conclusões com uma visão global no final do dia, quando tudo acaba, é muito fácil analisar – mas enquanto está acontecendo, um verdadeiro inferno é vivido.

Eu, como jornalista por profissão, mas, acima de tudo, ser humano, consigo deixar a análise dos fatos, a consciência política e o furo de reportagem diante do momento histórico um pouco de lado e me colocar no lugar de alguém que tenha como função lutar e defender, quando necessário. A tensão. A adrenalina. O instinto de sobrevivência, que é comum a cada um – por mais que ele, por exigência da profissão, precise agir como se fosse apenas corajoso e não tivesse um.

Sei que não existe perfeição, há corruptos e irregularidades em qualquer lugar. Mas estamos falando da função de cada um. E a do policial é proteger a nós, cidadãos, dos bandidos.

Por que na hora de demonstrar uma opinião politizada, no noticiário comum, lembramos desta função maior e, em nome dela, criticamos o governo e ressaltamos o quanto são mal remunerados (o que é totalmente pertinente!), todavia, na hora de uma manifestação, o senso comum é criticar o excesso da polícia, como se, subitamente, eles passassem de “mocinhos” a “vilões”?

(Excesso? Se for apenas para analisar alegorias, e não ninguém individualmente, o excesso, o ataque, a violência, partiram primeiramente da população! A policia, que, caso se esqueçam, tem, inclusive, a função de defesa, apenas reagiu e cumpriu com a sua obrigação! Cuidado com a análise superficial e a inversão de valores! Claro que estamos falando de tendências, e não de casos isolados. Esquecê-los seria promover a injustiça. Houve, sim, agressão gratuita da polícia. Inclusive, contra meus colegas! Mas, do que foi considerado “excesso”, não foi tudo).

Fonte: noticias uol.com.br

Fonte: noticias uol.com.br

Compreendo, é que, nesta hora, estão sob o comando do Estado, que combatemos. Mas será que, analisando individualmente, na manifestação, só existem pacifistas e pessoas movidas por pura ideologia? (Tomei conhecimento de vários jovens que dependem dos pais e/ou dos avós e, por pensarem que isso é tudo na vida – diferente daqueles que investem na carreira, são responsáveis e ainda precisam de merecida ajuda, quando possível, devido à nova realidade do mercado de trabalho -, vivem para comprar roupa de marca, celular do momento, que matam faculdade para beber e que usaram a manifestação apenas como motivo para sair mais cedo do trabalho. Certamente, mal sabem o nome de nosso vice-presidente).  Será que, quando aquela massa ameaça arrebentar o portão, ou joga bombas, pedras e depreda tudo por onde passa, não estão aqueles homens em estado máximo de tensão, sabendo que, se a violência se espalhar para toda a multidão, eles certamente sairão gravemente feridos ou mesmo mortos, e não será mais “Polícia versus População”, mas seres humanos lutando pela sobrevivência e, portanto, reagir seja não apenas a manutenção da ordem, mas o instinto de conservação (por melhor que seja seu treinamento)?

Quem se habilita a deixar a sala de aula, o sofá de casa ou a redação e exercer este trabalho? É muito fácil criticar quando não se coloca no lugar do outro. Quando nunca se viveu a experiência de um combate – de grandes proporções, briga em bar, não vale – e espera perfeição, porque só se conhecem as ideias e julga-se o outro como se fosse infalível, um robô. Se o assunto não fosse apenas político, e por este prisma analisado, mas psicológico, saber-se-ia que, na Psicologia, existe algo chamado “empatia”. A arte de se colocar na pele do outro. O que fica muito difícil quando seres humanos são generalizados e reduzidos a figurantes em uma ideologia.

Esqueçam a alegoria (polícia/ estado/ população), pensem nas imperfeições humanas… Há pessoas exaltadas e inadequadas à função em qualquer lugar: na empresa, na escola, na repartição pública, nos camelôs, na feira, no templo religioso… e também na polícia. Quem atingiu jornalistas e pessoas comuns, ainda que sob ordem, será que saberia distinguir um do outro; ou, que nem sob ordem estava, era apenas um desses exaltados ou inadequados, que não respondem pela corporação? Da mesma forma que admiráveis manifestantes pacifistas reforçam o quanto os vândalos não os representam?

Dois pesos, duas medidas, não: ou os policiais que erraram devam ser isolados e não representem A Polícia, ou os vândalos são Os manifestantes. Se for assim, mais um motivo para a polícia agir, para evitar a desordem coletiva, que prejudicaria a todos, e não tem nada a ver com exercício da democracia!

Talvez, o indivíduo que queira exercer o seu direito de cidadão saiba a razão nobre, o cansaço e a verdadeira indignação que o motive, fique chocado ao encontrar a polícia e se sentir ameaçado. Contudo, e muitos outros, será que estão motivados pela mesma boa intenção? E o policial, em segundos, antes de uma ação inesperada, consegue facilmente distinguir um do outro (você conseguiria?), como se estivesse estampado no rosto, ou é apenas um ser humano sob extrema tensão, lutando pela própria vida e simplesmente exercendo a profissão?

Como eu me orgulho daquelas milhares de pessoas, unidas não apenas fisicamente em uma mesma passeata, mas também “idealisticamente”, defendendo causas similares por todo o país, onde o povo demonstrou sua indignação!!! Que entregavam flores a policiais, pediam paz, apagavam fogo e limpavam a sujeira dos radicais. É mesmo um riquíssimo momento histórico. Mas que o custo-benefício seja utilizado. Que a benfeitoria democrática, analisada apenas sob o prisma social ou político, não ofusque a regulamentação de uma manifestação democrática, para que, de fato, todos sejam livres e tenham seus direitos garantidos.

Fonte: tudonainternet.com

Fonte: tudonainternet.com

Na minha opinião, algumas leis deveriam ser criadas. Primeiro, vandalismo e qualquer gesto violento ocorridos simultaneamente a manifestações seriam ainda mais graves que os mesmos em atos isolados, pois teriam o agravante de desmoralizar um movimento legítimo e atentar contra a democracia. Não dá para aceitar fogo – além de destruição a patrimônio, é crime ambiental! -, depredações e violência! Mas também, não dá para deixar de se expressar – isso seria um retrocesso, a perda de um direito conquistado às custas de muito suor e, lamentável e literalmente, sangue!

Portanto, em vez de povo e polícia brigarem enquanto os vândalos fazem a festa (por mais manifestações de apoio isoladas que tenham existido como o belo abraço entre manifestante que apagava o fogo e o policial, ou os policiais que sentaram e conversaram – refiro-me à opinião pública em geral), que tal a polícia ter legitimidade ao agir contra os baderneiros sem que este gesto seja compreendido pela opinião pública como autoritarismo e que, pressionados para não passar a imagem errada, eles precisem se ausentar e deixar a cidade sob o comando desta desajustada parcela da população – que foi o que ocorreu – ou agir e serem vistos como ditadores?

O cidadão tem direito à segurança. Como, em nome da própria democracia, posso perdê-la? Ordem é uma coisa; repressão, autoritarismo, ditadura, é outra. Mas as barreiras entre ambas são linhas tênues, e, principalmente pelo trauma do execrável passado opressor – o que é compreensível -, parece que a maioria coloca tudo na mesma panela.  Se entendessem de Psicologia individual (e o quanto os traumas nos obscurecem a mente e atrapalham ações), talvez compreendessem o comportamento humano do coletivo. E entendessem que polícia agindo “contra” a população não é sinônimo de ditadura – pois os bandidos podem estar apenas disfarçados de “povo”. Os efeitos são os mesmos, mas as causas, distintas. Daí, o mal entendido. Pois uma análise superficial e rápida só consegue enxergar efeitos. Para compreender as causas, é preciso aprofundar-se (ter trabalho, gastar tempo…).

Além disso, no que tange à liberdade de ir e vir, que a própria democracia também nos garante, deveria haver uma definição do que é manifestação e do que é desrespeito a ordem coletiva, o que permitiria, sim, a intervenção imediata (após uma tentativa de diálogo, apenas, como uma advertência antes da multa propriamente dita) do Estado para dissipar a multidão e restabelecê-la: haveria um local específico em cada cidade, ou um terreno abandonado, ou algo desativado, como um sambódromo (público, não particular), autódromo (não sei, é apenas um esboço de ideia, que pode muito bem ser aperfeiçoada), para que quem quisesse se manifestar ficasse reunido. Seria obrigatória a cobertura de imprensa, tal qual é obrigatório o horário gratuito político. Pois é claro que uma multidão que invade uma avenida famosa e para tudo, gera muito mais comoção que um grupo de pessoas em um ambiente já previamente preparado para tal finalidade. Com o tempo, talvez, a imprensa perdesse o interesse porque seria “notícia velha”, mas com a lei, a visibilidade dos protestos estaria, assim, garantida.

Fonte: brasilacorda.com

Fonte: brasilacorda.com

Além disso, deveria haver um tempo máximo de paralisação de setores e um intervalo de tempo para que uma manifestação pudesse ocorrer novamente, a fim de que o país não parasse de vez (tipo, no máximo uma semana, com intervalo de quatro semanas entre um(ns) e outro(s)), o que gera inflação (estudem Economia) e caos em todos os sentidos. O prejuízo não é apenas do político, mas, principalmente, de quem protesta. Porque a paralisação política não para apenas a política, mas todos os  outros setores da vida coletiva e individual.

E, por fim, essas pessoas não poderiam, de forma alguma, interromper vias (principalmente rodovias) e qualquer ato violento estaria previsto na lei explicada anteriormente. Além de não tapar a cabeça, tal qual, por segurança, é proibido em estabelecimentos diversos. Pois uma manifestação democrática, pacífica, não pressuporia o uso gás de pimenta ou efeito moral e não haveria, então, necessidade de proteção. Só se esconderia quem tivesse má intenção e não quisesse dar a cara a tapa.

A democracia seria exercida, mas a cidade funcionaria normalmente, assim como a vida de quem não quer – e é um direito – ou não pode, por outros compromissos, envolver-se diretamente com o caráter histórico/político, e precisa seguir sua rotina. Exercício da democracia que se imponha perante o governo é essencial, mas que cerceie o próprio cidadão, está mais para autoritarismo – originado apenas do outro lado da balança!

Democracia não é bagunça, mas liberdade. É respeito ao cidadão. E a minha liberdade de protestar termina onde começa a do outro cidadão de circular, de resolver outros tipos de problema. Ou, mesmo, de querer ou não mudar alguma coisa.

Pergunto-me… Por que, por exemplo, desta mesma juventude tão motivada, que pode deixar os estudos para manifestar-se nas ruas, não utiliza também esta força e ideologia para, de volta às universidades, no intervalo das aulas, mobilizar-se a fim de criar Projetos de Leis Populares, arrecadando fundos para viajar pelo país e colher assinaturas? Por que não trocam os costumes horrendos de trotes com constrangimento alheio ou brincadeiras infelizes por algo consciente, como já ocorre com alguns locais que adotaram o trote solidário? Já que são tão engajados, por que  não aderir de forma massiva ao trote conscientizado? Ou que “agitem” uma festa a menos por mês, somente (que continuem com as outras, que fazem parte do período que vivem, não sou bitolada!), e a substituam por movimentos políticos? Ou utilizem mais toda esta saúde e esta força em direção à vida pública e social e menos na busca desenfreada pelo celular do momento, da roupa de marca, do número de pessoas que pegou na balada ou da página no facebook popular e agitada! (Claro, refiro-me aos que “pegaram carona” na onda dos outros, pois sei também que muitos já são verdadeiros idealistas e revolucionários e merecem nossa admiração!!!).

Certamente boa parte das pessoas que foram à ruas são não apaixonadas (o que é bacana, eu tenho vários exemplos no meu convívio), mas obcecadas por futebol e, alienados, o têm como causa maior de vida (mais que família, que trabalho, que sociedade, que autoestima) e ajudam, por serem manipulados pelos meios de consumo – não por real amor ao esporte – a movimentar este mercado bilionário. A despeito da reivindicação do investimento na saúde e na educação em vez de aprimorar estádios. (Reivindicação esta, legítima, porém, tardia – afinal, o dinheiro já foi gasto, deveriam ter se manifestado quando ainda se cogitava o assunto para evitar o uso, o que aconteceria se fôssemos, de fato, um povo realmente conscientizado. Embora “antes tarde, do que nunca” e “toda caminhada começa no primeiro passo”). Contraditório.

Senso assim, pergunto-me: será que todos que se dispuseram a doar uma semana de suas vidas estariam dispostos a acompanhar assiduamente (para o resto de seus dias) os noticiários e ter ampla noção de sua vida política? Será que, além de exigirem seus direitos como cidadãos, cumprem com seus deveres? Será que cedem o lugar no ônibus aos mais velhos, às mães, mesmo que os assentos preferenciais já estejam todos ocupados? Será que ouvem seu MP3 em volume baixo e com fone de ouvido, respeitando o direito do outro passageiro de ler, refletir, conversar e até mesmo dormir? Será que, conscientes de que estarão em um ambiente público fechado e restrito, não em seu automóvel particular, não tomam banho de perfume e deixem seu cheiro impregnado, incomodando desde pessoas que não gostem de tal tipo de fragrância, até grávidas e pessoas doentes, que poderiam ficar enjoadas?

Será que param na faixa para o pedestre passar? Será que dirigem embriagados? Será que furam fila? Ficam com o troco a mais (e lesam o funcionário ou o patrão, não apenas trabalhador, mas provedor de empregos)? Será que fumam em locais públicos, como pontos de ônibus (mesmo que ainda não haja legislação específica em todos os lugares, é bom senso), onde o fumante passivo precisa permanecer, até que seu transporte chegue?

Será que jogam lixos nas ruas? Que reciclam seus dejetos? Será que ainda queimam mato? Que discutem no trânsito? Que usam o automóvel não por utilidade, mas, em um trânsito tão caótico e em um planeta tão doente ecologicamente,  o usem como carro alegórico, para satisfazerem a vaidade e ter status ou para exibir-se com um som exageradamente alto, desrespeitando não apenas o gosto musical alheio, como infringindo a lei e gerando poluição sonora? Será que fazem barulho depois das dez horas e não se incomodam nem com a lei, nem com os vizinhos? Será que votam com consciência, ou são como os que faltam à reunião de condomínio: não fazem a sua parte e depois querem se sentir o direito de reclamar da decisão? E, alguns, quando contrariados, quebram o que é deles, que eles mesmos terão que pagar…

Será que o que move pessoas assim é, realmente, a democracia, a coletividade? Ou estão ali para acompanhar os amigos, para levar o cartaz “Mãe, tô na Globo”, para ter a sensação de estar no centro da notícia, sem, muitas vezes, nem saber exatamente por qual motivo exato está ali?

Qual é, de boa parte desta população, o compromisso real com a política, longe da influência da comoção coletiva e dos holofotes? É fazer de fato a sua parte e, com absoluta razão, ficar indignado com a cara de pau de quem representa o cidadão, ou viver alienado, deixar tudo correr solto, permitir que quem não mereça tenha acesso ao poder graças ao seu próprio voto e depois, tal qual uma criança birrenta, imatura, bater os pés e ficar revoltado ao ser contrariado?

Qual é a novidade da politicagem, da corrupção e do “mamar nas tetas”? Tirar alguém inadequado do poder ou gritar seus direitos é rápido e fácil. Quero ver o gigante realmente acordar para as suas responsabilidades (que exigem mudança de comportamento, comprometimento, trabalho, esforço, mudança na rotina), eleger (e acompanhar) um político humano, alguém genuinamente preparado. O que, se aderido por vários, criaria uma nova ordem na política e tornaria a vida dos corruptos bem mais difícil, não existindo a necessidade de algo tão repentino como uma paralisação, pois as coisas já funcionariam de forma regular. Estamos nos excessos: não controlamos NADA, há abusos, não reclamamos e, uma hora, simplesmente explodimos.

Que, assim como uma família sem informação que ainda resolve tudo na base da porrada, e outra já mais instruída, civilizada, que põe em prática o conhecimento de psicologia e favorece o diálogo, nós, não por utopia, mas seguindo o exemplo palpável de países já desenvolvidos, também batalhemos para elevar nosso nível educativo.

Que tenhamos a política não como um acontecimento isolado, mas sedimentada em nossas vidas, de modo que todos sejam tão participativos que a opinião pública seja ainda mais decisiva para orientar a atitude dos políticos, e que a simples manifestação de ideias e livre expressão da imprensa seja suficiente para envergonhá-los e lembrá-los do porquê estão ali, sem que o confronto seja sequer cogitado. Pois a violência e a força bruta são inerentes a um estado instintivo da Humanidade (estudem História, Sociologia), mas as ideias e a noção de consciência são conquistas obrigatórias do homem que se supera e busca elevar-se ao nível do raciocínio, permitindo que o combate ocorra, sim, mas no admirável plano  das ideias e do diálogo.  Este gera elevação enquanto aquele, destruição.

Por outro lado, o povo apenas sai às ruas e mostra-se como é. É preciso, sim, compreender e olhar com carinho para suas (nossas) carências. Quem sabe se houvesse educação (ao menos ela, contudo, melhor ainda seria se houvesse toda a estrutura de vida para que cada indivíduo estivesse satisfeito – saúde, segurança, empregos e economia estável), que não apenas daria noção de dignidade a estas pessoas, como estimularia suas virtudes até mesmo para vencer um meio hostil, elas não fossem presas tão fáceis do crime, do consumismo, da ociosidade? Da baderna. Da violência.

Se passamos um vexame internacional, pois temos “visita” em casa e escolheram justo este momento para lavar a roupa suja, que os governos, antes de firmarem tal compromisso, pensem se os “filhos são educados”. E, ou deixem de bater neles e os eduquem, a fim de que sejam aptos a “fazer o social”, ou desistam de querer conviver com países de primeiro mundo, escondendo-se no fundo do quintal do subdesenvolvimento.

(Repito, acho a causa mais do que justa. Nem ligo para futebol – só um pouco, quando é Brasil – e uso o SUS, portanto, sei na pele onde está a prioridade. Todavia, não questiono o “o quê”, mas o “como” e os “porquês”, o que, nem sempre, leva aos mesmos destinos…)

Tem boa intenção quem esconde o rosto?  Fonte: ocidadaorj.com.br

Tem boa intenção quem esconde o rosto? Respondendo ao cartaz de papelão: NADA justifica a violência! Quem apenas reage repete um gesto automático, sem esforço pessoal e iguala-se ao agressor. Difícil mesmo é AGIR promovendo o Bem, vencendo obstáculos – trabalhando interiormente e, depois, fazendo a diferença no meio onde vive.
Fonte: ocidadaorj.com.br

Tudo tem o seu lado bom e ruim, esta é outra sabedoria de vida. Ainda que, com vaidades, demagogias e violência, possamos extrair deste gesto o que ele deve ser: a esperança de um país melhor, a consciência do poder que o povo tem, o cansaço da exploração, da injustiça, da corrupção. Abaixo a PEC 37. Por que pouca gente falou da temida inflação? Que o transporte público, caótico, vergonhoso e caro seja, de fato, melhorado (em minha cidade há uma nova modalidade de transporte: o liquidificador. Ele vem disfarçado de ônibus, mas, usando a descrição de uma amiga quando eu narrava meu sofrimento, basta entrar para fazer tratamento de celulite, de tanto que trepida – os vidros, os metais, você…). É o mínimo, nós merecemos! E que realmente o saldo seja positivo, para todos os aspectos.

Se a luta é, de fato, pela democracia – e não pela vaidade individual de pessoas que se autoinfluenciam e atraem outras por afinidade, por participar de uma cena histórica ou querer a admiração alheia por ser “politizado” – cada cidadão que pensar diferente do que diz este texto mostrará o quanto é democrático ao respeitar a minha opinião ao exercitar o meu direito de liberdade de expressão, ainda que ela seja distinta da maioria.